quarta-feira, 20 de setembro de 2017

Lido: Adeus, Portugal!

O grande problema da sátira é só funcionar quando quem a faz traz algo de novo e não se limita a repetir o que outros já antes disseram, e o enorme problema das sátiras que têm como alvo Portugal e as supostas características do país e do povo até tem nome e tudo: Eça. É que contam-se pelos dedos de uma mão os que tentam satirizar Portugal enquanto país habitado por gente bizarra, cheia de esquisitas características só suas, e não acabam por parecer uns imitadores de terceira categoria porque Eça de Queiroz já o fez há mais de cem anos e já disse tudo e muito melhor do que quase todos. Paula de Lemos tentou juntar-se a esse ultra seleto grupo. Ficou bem longe. Bem longe.

Adeus, Portugal! é uma sátira, escrita em jeito de alegoria, sem personagens propriamente ditas mas povoada por "portuguesíssimos" tipos humanos (ou melhor: caricaturas de), mesmo chamando-se um deles Vladimir e outra Quixota. Uma novela fantástica que tem como alvo principal a burocracia e os burocratas, ou melhor, esse núcleo de todos os males da nação que é o funcionário público. Sim, porque toda a gente sabe que isto sem funcionários públicos, sem instituições, era o paraíso.

O resultado, apesar de haver quem goste (o júri do Prémio Manuel Teixeira Gomes de 2002, por exemplo, que lhe deu o primeiro prémio) é perfeitamente lamentável. As piadinhas sem graça arrastam-se ao longo das 76 páginas da novela, repetitivas, cansativas, acabando por se tornar insuportáveis muito antes do fim. A ideia básica percebe-se à terceira página, até porque em nada se distingue daquelas conversas de café ou de facebook prenhas de niilismo e ignorância que todos estamos fartos de conhecer, servindo as 70 e tantas que se seguem de pouco mais que reforço para os duros de entendimento que não perceberam logo às primeiras. Sim, porque o enredo, que até existe, é totalmente secundário no meio de tudo isto.

A melhor coisa que posso dizer deste livro é que a língua portuguesa não sai dele maltratada. Para mim é pouco, pouquíssimo. Mas há aqueles para quem basta. E há também gente com um sentido de humor diametralmente oposto ao meu, malta que acha graça aos Donos Disto Tudo, que a mim só raramente conseguem despertar um ténue sorriso (ou conseguiam, quando ainda perdia tempo a tentar ver o programa). É possível que essa malta ache este livro hilariante, o mais gargalhante regabofe desde os trocadilhos dos Malucos do Riso. Provavelmente haverá por aí pessoas em quem o humor (consegui resistir a pôr aspas, sou o maior) de Paula de Lemos ressoa.

Em mim é que não ressoa, de todo. Ler este livro foi um penoso exercício de paciência e teimosia. Felizmente é curto. Há que agradecer as pequenas benesses.

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